Escrevo este texto dos Alpes Suíços, em um centro de unidade em que estou atuando como voluntária.
À minha frente, as montanhas cobertas de neve me inspiram a compartilhar o meu momento. Ao meu lado, uma xícara de café aguarda as pausas naturais a cada respiração profunda para que o seu delicioso sabor seja desfrutado.
Mas nem sempre o cenário foi este…
Em um dos momentos mais decisivos da minha vida, uma xícara de café também me acompanhava. Da janela do nono andar de um escritório situado no centro do Rio de Janeiro, eu admirava o céu brilhantemente azul do verão carioca. Naquele momento, eu desejava estar livre e batia a minha cabeça vagarosamente contra o vidro da janela. A angústia era tanta que eu não conseguia sentir o sabor do café preparado com carinho pelas copeiras da empresa em que eu atuava. Sentia-me em uma prisão.
A minha relação íntima com o café iniciou no ambiente corporativo quando eu tinha apenas quinze anos. Para conquistar a minha independência e “liberdade”, comecei a trabalhar muito cedo e, consequentemente, a usar o café como válvula de escape para a pressão que recebia.
Vinte e três anos depois, essa relação mudou. Já provei, tranquilamente, o café de mais de dez países da Europa e é essa experiência que quero compartilhar aqui na coluna Você e o Café.
A decisão que tomei naquele dia quente de verão foi de renunciar a minha carreira e zona de conforto para iniciar um projeto de volta ao mundo em benefício da educação e da sustentabilidade. Escolhi ser livre.
Desde março de 2017, tenho viajado pela Europa cooperando como voluntária em comunidades sustentáveis e visitando diferentes escolas inovadoras. No meu blog, Voe Nessa, você encontra os detalhes desta minha jornada planejada para durar cinco anos (um em cada continente).
Uma das minhas atividades preferidas, depois de explorar a região, é sentar em uma cafeteria tradicional para saborear um cheiroso café e observar o vai-e-vem dos locais, conversar com os garçons, compartilhar minhas experiências virtualmente com os amigos e, a cada gole, agradecer a oportunidade de experimentar diferentes culturas, climas e formas de fazer café.
Na Espanha, em minha primeira parada, tive a sorte de ficar na casa de um amigo brasileiro e continuar tomando o nosso café de cada dia.
Em Portugal, o sabor ficou infinitamente melhor acompanhado do tradicional pastel de Belém. Mas eu tinha que pedir sempre o café longo porque o normal era apenas um dedinho de café.
Dispensei o famoso chá inglês para também tomar café em Londres.
Mas foi na Escandinávia que eu me realizei. O povo para tomar café, gente! Os escandinavos são os maiores bebedores de café do mundo. Tomam mais de 10kgs per capta (o dobro dos brasileiros.)
Na Suécia, pude provar o café do Palácio Real de Estocolmo.
E, na Dinamarca, tive experiências marcantes. A primeira foi a participação em um evento público na cidade de Aarhus, onde eles distribuíram o café brasileiro gratuitamente. Era o único café do evento matutino que tinha a presença de várias figuras públicas e famosas da região. Pense numa pessoa orgulhosa de ser brasileira?! ?
A segunda experiência em terras dinamarquesas foi com a construção natural de um telhado vivo com sedum, musgos e mais algumas pequenas plantas, onde primeiro tínhamos que encher com terra e areia 60 sacos de juta de café (cada um pesando em média 25 kg), costurar e içar. Naquele telhado, várias nacionalidades foram representadas através do café e o Brasil marcou presença com a grande maioria dos sacos.
Na Croácia e, principalmente, na Bósnia, o café turco predomina. Foi uma das formas mais diferentes e chiques que experimentei até hoje (diferente porque ele não é coado e chique porque é servido em utensílios de prata e bronze trabalhados a mão). Modo de preparo: ferver a água, acrescentar o pó e mexer até que o mesmo desça ao fundo. Um pouco de água fria é adicionado na hora de servir para que o pó desça mais rápido. O último gole não deve ser tomado ou sua boca vai ser puro pó. Fica a dica!
E se eu disser que na Hungria fiquei dez dias sem tomar café? Meu recorde! Quase tive crise de abstinência. Na ecovila em que me hospedei, não havia café e nem cafeteria próxima.
Aí fui para a Áustria e, para compensar, escolhi ser fina no café central de Viena.
Já na Alemanha, em uma das cidades verdes globalmente conhecidas por suas práticas sustentáveis (Freiburg), o orgulho de ser brasileira encheu o coração de alegria novamente ao descobrir que a cafeteria internacional que eu visitava tinha o projeto carioca Curto como uma de suas inspirações.
O foco da minha jornada não é o café, mas ele sempre está presente de alguma forma me despertando nos dias frios, acompanhando uma conversa interessante ou apenas me fazendo companhia enquanto aprecio a Natureza e me conecto com a minha essência, como agora na Suíça.